sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Paredão


Parede do Açude Umari, em Upanema (RN) 

Paredão para mim é esse aí.  O resto é brinquedo que faz zoada e incomoda, de adolescente besta, que gosta de aparecer.


Hoje em qualquer cidade
Não há local de sossego
Na periferia ou centro
Não existe aconchego
A partir da invenção
Desse tal de paredão
Só quem dorme é morcego


É uma grande besteira
Procurar a autoridade
Hoje é um só delegado
Pra seis ou sete cidades
Com o carro indisponível
Por falta de combustível
Fica sem mobilidade


Certo dia, uma turma
Curtindo a sua noitada
Com um som amplificado
Em uma hora avançada
Certamente se lixando
Por se encontrar profanando
Uma norma que é sagrada


Um marchante diplomado
Pela escola da vida
Sendo aluno laureado
Sem matéria repetida
Vai pedir para baixar
Aquele som "de lascar"
Que incomoda a avenida


Precisando descansar
De uma labuta pesada
Querendo se recolher
Na sua hora marcada
Se depara com a conduta
Daqueles “felasdasputa”
Que deixa a rua acordada


Tinha uma moça magrela
Das pernas "fina" e zambeta
Parecia que sambava
Pilotando uma lambreta
Seu corpo foi inspirado
Num desenho inacabado
De um chassi de borboleta


Um macho da bunda grande
Dançava a quebradeira
Rebolando até o chão
Balançando as cadeiras
Vez por outra toca um funck
O nego dá um arranque
Feito um fusca na ladeira


O trabalhador cansado
Doido pra curtir seu sono
Se dirige ao quartudo
Que do paredão é dono
Antes, mesmo, de falar
Ouve: - Nem venha chorar
Meu sonzão eu não raciono


Paciência tem limite
E momento de acabar
De tanto pedir a eles
A fineza de baixar
Pensa: - Só podem ser loucos
Ou então devem ser moucos
Pra conseguir suportar


Depois de se rebaixar
Mesmo com toda razão
Se vê desmoralizado
O humilde cidadão
Decide fazer besteira
Puxando a faca peixeira
E empunhando o facão


Diz: - Mulher traga a bacia
Grande, de "aparar fato"
E a vara de virar tripas
Deixe que eu mesmo trato
O da bunda empinada
Vai virar uma buchada
É o primeiro que eu mato


O sujeito quando viu
O brilho da "lambedeira"
Suspendeu o rebolado
Disparou numa carreira
Quase que “arreia o barro”
Antes de saltar no carro
E engatar a primeira


Nem se lembrou que o reboque
Tava em mau posição
Com energia ligada
Através da extensão
Quando o carro disparou
O fio se esticou
Partindo a fiação


Foi fogo pra todo lado
Antes do som se calar
Na posição que estava
Não foi possível aprumar
O reboque capotou
O sonzão se espatifou
E a paz voltou a reinar


O restante da história
Nem precisa dar guarida
A “mundiça” se encantou
Ohh povo bom de corrida
Só a zambeta magrela
Que ninguém, depois, viu ela
Permanecendo sumida


Encontraram a menina
No terceiro amanhecer
Pense numa cena linda
Que só vendo, para crer
Aquele resto de feira
Trepada numa craibeira
Sem conseguir mais descer


(Pedro Augusto Fernandes de Medeiros)


A história toda é uma ficção, porém alguns termos são influenciados pela "lenda rural" narrada por Everaldo Cabeção e registrada por Jesus de Miúdo, em seu blog: http://acaridomeuamor.nafoto.net/photo20090724213939.html


Dedico ao acariense Everaldo esta postagem e me solidarizo com ele, pela perda do seu pai, Joaquim de Cristóvão, ocorrida esta semana.

4 comentários:

  1. Esse tipo de coisa acontece praticamente todos os dias - sempre tem um grupinho com o som ligado para o mundo todo ouvir, e não se importam se tem pessoas querendo descansar, pessoas doentes, bebês dormindo.
    Adorei a inspiração desse cordel.
    Ficou muito engraçado também. Nunca tinha escutado falar em "chassi de borboleta".
    Continue assim, com versos que nos supreendem.

    ResponderExcluir
  2. Pedro, ficou uma beleza este cordel. Tema muito pertinente e você abordou com maestria e humor. Infelizmente, há muita gente sem sensibilidade e respeito abusando da ordem pública.
    Parabéns!!!
    Fraterno abraço,
    Célia

    ResponderExcluir
  3. Que história engraçada, me fez rir ao ler, pena que se trata de uma realidade. A poluição sonora hoje em dia é enorme, alguns engraçados querem obrigar a várias pessoas ouvir o que não gosta e impedi-las de fazer o que gosta: dormir, assistir televisão etc. É bom se divertir, mas tem que respeitar o direito dos outros, e tem como ouvir música e se divertir sem exageros.

    Parabéns, Pedro...Adorei!
    Kelly!!!

    ResponderExcluir